A história do yoga narrada como fantasia

6 06America/Sao_Paulo agosto 06America/Sao_Paulo 2021 0 comments Jayadvaita Categories ArtigosTags , ,

Veracidade no Conhecimento 

Sabe-se da atração que impera na mente humana por questões misteriosas e até sombrias. Sabe-se também da intenção manipuladora presente na ação de pessoas de má índole. O que geralmente não se sabe (ou esconde-se) é da presença destas forças na disseminação e implantação da filosofia do yoga ao redor do mundo.

Parte 2 – Constate, antes de depositar sua fé

É um fato que a crise espiritual torna possível a implantação de crendices e idolatria de elementos díspares daqueles que, originalmente, conduzem a alma humana à sua realização espiritual. Em tratados literários como Bhagavad-gita e Yoga-sutra, vemos claramente o objetivo do processo de yoga: liberação dos condicionamentos gerados pela identificação ilusória da realidade sensorial e perceptível. De modo simples, a filosofia do yoga visa promover a liberdade da alma (kaivalya).

No entanto, quando vivemos em um mundo interconectado, repleto de promessas e distrações, torna-se fácil oferecer atrativos efêmeros. Se, paralelo a isto estabelece-se um sistema de orientação, educação e conhecimento engenhosamente moldado para fins que não cumpram com o verdadeiro sentido do que se considera conhecimento, as pessoas destituídas de premissas e parâmetros de avaliação aceitam a ignorância como conhecimento absoluto.

Lapidando o significado

É importante entender o significado de certos termos como conhecimento e absoluto. Ambas são palavras deterioradas historicamente pelo uso e aplicação semântica na sociedade ao longo dos séculos. Por exemplo, quem define o conceito de conhecimento é algum órgão de poder. Este mesmo órgão de poder define padrões relativos que destroem a noção de absoluto ou, quando possível definem absoluto o seu próprio poder. Isto é muito comum nos sistemas de poder político – aliás, é sua maior força.

Mas, voltamos aos conceitos. Conhecimento deriva da palavra sânscrita vidya. Esta mesma raiz dará o conceito de Veda, ou base do conhecimento sobre tudo que esteja no campo físico e no campo metafísico. Assim, conhecimento verdadeiro não é parcial. O conceito original de conhecimento está diretamente atrelado à ideia de absoluto, pois o conhecendo provém de uma fonte absoluta. A ideia de um iluminismo proveniente da razão humana que nega um antecedente original ou transcendente é uma grande falácia para encobrir sua alegoria oposta: a escuridão.

Escuridão é sinômino de ignorância. Na mesma língua sânscrita, ignorância significa avidya, ou seja, a ausência de conhecimento. Sem conhecimento, tudo é relativo e impossível de se compreender um princípio absoluto na realidade. O que vemos aqui é uma dualidade. Conhecimento x ignorância. Relativo x absoluto. Do relativo só podemos extrair ignorância, ou conhecimento parcial, condicionante. O conhecimento provém do absoluto e, por isto, o conhecimento tem como finalidade dar luz sobre o Absoluto à consciência humana.

Em outras palavras, o conhecimento é o que nos conduz ao objeto do conhecimento, ao conhecível. Isto é, o Absoluto.  

A fé no relativismo

Quando se elimina as vias do conhecimento real da filosofia do yoga, e se delimita interpretações escusas, lança-se bases para experiências moldadas num relativismo estéril e árido à consciência. Desse modo, constrói-se uma nova religiosidade espiritualista relativista onde não haverá predominância de valores, mas a degradação dos mesmos.

Esta construção torna-se possível devido ao direcionamento dado às doutrinas do yoga como novas alternativas à crise espiritual. Assim se pauta as teorias da Nova Era. O problema básico nisto é sua completa ausência do conhecimento absoluto e sua tentativa de definir a crise espiritual como uma crise religiosa, o que torna fácil e simples implantar o yoga como uma fé que substituirá a religião, sanando a crise espiritual.

O fato é que já sabemos dos prejuízos trazidos pelo uso da religião como instrumentos políticos ou ideológicos. Logo, sabemos que a implantação deste método na cultura do yoga foi o responsável por destruir ou encobrir o verdadeiro objetivo do yoga: liberar o ser humano de todo condicionamento ilusório. 

A questão é: a arma implantada ao longo da história foi fantasiar e iludir o ser humano. Vale lembrar que, no Bhagavad-gita (4.42) Krishna instrui Arjuna armar-se com o conhecimento do yoga e lutar.

A verdadeira luta

Parece contraditório pensamos em paz, equilíbrio e igualdade atrelado a uma luta através do yoga. Mas, assim como negar a existência de princípios absolutos, negar ao yoga a atuação em luta, faz parte da mesma narrativa fantasiosa contada ao ser humano em sua ignorante escravidão.

Quando pensamos que o inimigo não existe, ele já está dentro de nós. É dentro de nossa mente que se efetua a grande batalha no momento atual. Esta é uma característica da atual Era de Kali, a era das desavenças e hipocrisia. A luta é contra a ignorância e a arma é o conhecimento absoluto. Esta é a síntese do Bhagavad-gita: lute contra a forte identificação na ilusão de Maya.

Dualidade na unicidade

Certamente, a maior ruptura filosófica na tradição do yoga foi a interpretação do absoluto na visão de Sankaracarya (700 d.C). Sua concepção monista da realidade negou por completo a individualidade da alma e estabeleceu sua unidade com o Ser Absoluto. Entretanto, esta é uma compreensão parcial do todo, uma visão relativista do Absoluto, pois nos tratados dos Vedas evidencia-se que a compreensão de unidade (onipresença) é parcial e incompleta, se não acrescidos outros dois aspectos do Absoluto (onisciência e onipotência). Mesmo assim, ela foi absorvida e usada como principal instrumento de divulgação doutrinária do yoga pelo mundo, desde então.

Mas, que relação teria esta doutrina com as questões da fé? Todas, pois embasa a noção equivocada de relativização do Ser Absoluto e do próprio ser humano, quando na verdade, a alma é eternamente um princípio uno (individual e imutável) em relacionamento com Deus; daí tem-se a noção correta de dualidade: o ser e Deus são distintos em proporções de personalidades e unos em qualidades constituintes.

Este é o pilar erigido sob o pseudo conhecimento do yoga, um conhecimento parcial. Porém, suas consequências foram drásticas e permitiram a conversão de uma filosofia em uma falsa religiosidade espiritualista universal. Basta ponderar sobre o irônico “dia internacional do yoga”, proposto pela O.N.U.

Existem resquícios deste mesmo modelo de pensamento doutrinal em praticamente todas as antigas civilizações (egípcia, mesopotâmica, persa) expulsas do continente de Bharata Varsa. Isto, historicamente antes mesmo do nascimento de Sankaracarya. Quer dizer, todas as deturpações, doutrinamento e ilusão imposta à humanidade repousa na compressão parcial da verdade presente no conhecimento absoluto.

Trataremos mais sobre este assunto no próximo texto.